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Mortes, testes e contágio: Como o Brasil se compara a outros países na pandemia de coronavírus
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Em comparação a outros países, o Brasil tem a maior taxa de transmissão da doença, está entre os que menos fazem testes e registra a oitava maior taxa de mortes. Do ponto de vista econômico, deve ter um dos menores crescimentos do PIB no ano que vem.
A BBC News Brasil apresenta abaixo a situação do país no cenário internacional a partir de cinco dados: taxa de espalhamento da doença, taxa de morte por 1 milhão de habitantes, taxa de teste por mil habitantes, o número de dias que leva para dobrar o total de casos registrados e a previsão do PIB (soma de todas as riquezas produzidas) em 2020 e 2021.
É importante lembrar que cada país tem uma capacidade diferente de realizar testes na população para identificar que contraiu o vírus, e adota uma metodologia própria para contar seus mortos.
Além disso, países vivem momentos diferentes da pandemia. A Nova Zelândia praticamente zerou o número de casos, e a Itália deixou o pico para trás há semanas. Os Estados Unidos parecem estar passando do auge da doença e o Brasil ainda não chegou lá, segundo os especialistas.
Feitas as ressalvas, as comparações formam um retrato a partir dos dados mais recentes do país. Esse cenário muda todos os dias.
1. Taxa de contágio da doença
Um estudo divulgado pelo Imperial College de Londres apontou nesta semana que o Brasil está com uma taxa de contágio da doença de 2,81, a mais alta entre 48 países analisados.
Isso significa que uma pessoa infectada transmite a covid-19 para cerca de três pessoas.
O indicador, conhecido como R0 (“r zero” ou “r naught”), mede aqui o número médio de infecções geradas por alguém que contraiu o novo vírus (Sars-CoV-2).
Assim, se esse R0 é menor do que 1, o número de casos cairá gradualmente até zero, já que haverá cada vez menos gente infectada. Se é maior do que 1, o vírus se espalha de modo exponencial.
No Brasil, 10 pessoas infectam hoje outras 28, e estas infectam mais 78. Quanto mais alto for o R0, maior a bola de neve. Nos primeiros quatro meses de 2020, o Ministério da Saúde brasileiro registrou 85.380 casos de coronavírus e 5.901 mortes da doença no Brasil.
Essa taxa de reprodução básica do vírus pode ser calculada a partir do modelo epidemiológico SIR, que se baseia em dados como o número de pessoas Suscetíveis, Infectadas e Removidas (recuperadas ou mortas, por exemplo). A qualidade das estatísticas oficiais influencia diretamente a precisão das estimativas.
Hoje, a estratégia mais eficiente ao redor do mundo para diminuir essa taxa, contendo a pandemia, tem sido o isolamento social.
No Reino Unido, por exemplo, esse indicador beirava 4 em 12 de março, quando a única recomendação do governo era o autoisolamento apenas de quem apresentasse sintomas. Ou seja, à época, 10 pessoas infectadas transmitiam o vírus para outras 40. Duas semanas mais tarde, após o início de uma quarentena não obrigatória, o R0 despencou para 0,72. Ou seja, 10 pessoas infectadas espalham o vírus para outras 7.
Segundo o Imperial College de Londres, a Itália está atualmente com uma taxa de 0,67, com queda gradual do número de novos infectados e mortos.
2. Velocidade na qual os casos dobram
Os dados indicam forte aceleração da pandemia no país. “Eu odeio dizer, mas o Brasil está muito alto, o gráfico está muito, muito alto. Lá em cima, quase vertical”, afirmou o presidente americano Donald Trump nesta quinta-feira (30).
Trump se refere à linha que conecta os pontos em um gráfico com o número de casos (eixo Y) ao longo do tempo (eixo X). À medida que a pandemia acelera, a linha se torna uma curva cada vez mais inclinada para cima.
Mas a qual velocidade?
Um monitoramento feito pela Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) aponta que o número de pessoas infectadas e mortas no Brasil dobra a cada 5,1 dias. Apenas dois países aparecem acima do Brasil: Rússia e Sudão.
“Esse indicador ajuda a entender a velocidade de disseminação da epidemia. Quanto menor o número de dias para que ocorra a duplicação de casos e óbitos, maior a velocidade de contágio ou maior o número de exames realizados. Em ambos os casos, o indicador expressa a magnitude de avanço da doença em termos dinâmicos”, explica a Fiocruz.
3. Número de mortes por 1 milhão de habitantes
Os Estados Unidos são o país com maior número absoluto de mortes na atual pandemia: 63 mil. O Brasil aparece em décimo nessa comparação, com 5.901 mortes.
Mas especialistas afirmam que uma comparação mais precisa dessa variável deve levar em conta o tamanho da população de cada país.
Segundo dados do Centro Europeu para Prevenção e Controle de Doenças (ECDC), a pequena San Marino lidera esse ranking, com 41 mortes numa população de quase 34 mil habitantes (taxa de 1.208 por 1 milhão de habitantes).
Mas se formos levar em conta apenas países com mais de 50 milhões de habitantes, a Itália lidera o ranking, com 463 mortes por cada 1 milhão de habitantes. Em seguida, surgem Reino Unido (394), França (373), EUA (190) e Alemanha (75).
O Brasil aparece em oitavo, com uma taxa de 27 mortes por cada 1 milhão de habitantes.
Vale lembrar que cada país adota metodologia própria. O Ministério da Saúde da Espanha, por exemplo, conta de maneira regular apenas as mortes por coronavírus ocorridas em hospitais. A Itália conta aqueles que testaram positivo para o vírus, independentemente de a causa principal do óbito ter sido coronavírus ou outra condição.
É importante ter em conta também que cada país está em um momento distinto da pandemia. O governo brasileiro estima que o pico da pandemia ocorrerá entre maio e junho, o que deve aumentar bastante o número de mortes.
Se o Brasil atingir a taxa italiana, por exemplo, isso representaria 100 mil mortos.
Estima-se que a covid-19 leve ao óbito 2 a cada 100 pessoas infectadas.
4. Taxa de testes realizados a cada mil habitantes
Em geral, a qualidade dos dados usados (quantidade e nível de detalhamento, por exemplo) para uma projeção é mais importante para a acurácia dela do que o modelo matemático adotado.
Na pandemia atual, isso está ligado diretamente ao número de testes realizados para identificar se alguém contraiu o coronavírus ou não. Quanto mais exames, mais perto a estatística oficial estará da realidade. Quanto menos, maior a subnotificação.
Uma ampla realização de testes tem um papel importante nas estratégias elaboradas e adotadas por autoridades, especialistas e governantes para conter o avanço da doença.
Brasil é um dos países que menos realiza testes para covid-19, abaixo de Cuba e Chile
“Não tem fórmula mágica, não tem teste em massa. O que você tem que fazer é usar os testes para mapear a população de forma que sua amostra reflita o todo. Ter o dado, interpretar o dado e tomar iniciativas a partir disso é o que vai fazer toda a diferença”, afirmou o novo ministro da Saúde, Nelson Teich, a jornalistas em Brasília.
“Sem saber a real dimensão da epidemia, um governo pode agir atrasado ou adiantar medidas drásticas sem que sejas necessárias”, explicou o virologista Anderson Brito, do departamento de epidemiologia da Escola de Saúde Pública da Universidade de Yale, nos Estados Unidos, em entrevista recente à BBC News Brasil.
Na prática, o governo brasileiro não sabe dizer quantos testes são realizados por dia no país. Os números do Ministério da Saúde não incluem testes realizados em hospitais e clínicas particulares, somente na rede pública de saúde.
Até 20 de abril, segundo a pasta, a rede pública realizou 132 mil testes específicos para covid-19. Isso é quase o mesmo número de testes realizados pelo Reino Unido em um só dia: 120 mil em 30 de abril.
Considerando apenas essa quantidade de testes, o Brasil estaria na 65ª posição do ranking de 82 nações, segundo comparação feita pela BBC News Brasil a partir da plataforma de dados Our World in Data, da Universidade de Oxford — o Brasil não aparece nessa comparação por falta de dados atualizados.
Em 20 de abril, o país apresentava uma taxa de 0,63 teste a cada mil habitantes. O ranking era liderado pela Islândia (128), país nórdico com 365 mil habitantes. A Itália apresentava taxa de 23,1 e os EUA registrava 12,2.
O Brasil tem enfrentado uma série de dificuldades para ampliar sua capacidade de realização de testes, como a concorrência internacional para comprar insumos, alta de preços e demanda maior que a capacidade de análise dos laboratórios.
Ante a subnotificação, especialistas tentam calcular qual é o número real de infectados do país. Para se ter uma ideia, um estudo coordenado pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel) apontou que para cada pessoa contaminada por covid-19 no Rio Grande do Sul, há 12 casos não notificados.
5. Previsão de queda e recuperação do PIB
A economia brasileira terá uma queda cinco vezes maior que a média dos países emergentes neste ano, de acordo com previsão do Fundo Monetário Internacional (FMI) divulgada em meados de abril.
A previsão da entidade é que o PIB brasileiro vai cair 5,3% neste ano, enquanto os países com economias em desenvolvimento vão registrar, em média, uma queda de 1%. A zona do euro deve despencar 7,5%.
A retração prevista pelo FMI significa uma diminuição de quase R$ 400 bilhões na economia brasileira neste ano. Se a retração de 5,3% for confirmada, será a maior queda anual que o Brasil já viu pelo menos desde 1901.
Pesa aqui o fato de que o Brasil já vinha apresentando taxas mais baixas de crescimento econômico que outros países em desenvolvimento.
Na mesma categoria, dos países emergentes, também está o México — que, no entanto, vai apresentar uma retração ainda maior que a do Brasil, de 6,6%. A economia da Rússia, segundo o FMI, deve cair em proporção semelhante à do Brasil: 5,5%.
China e a Índia devem apresentar crescimento neste ano, mesmo com a crise do coronavírus, segundo o FMI: 1,2% e 1,9%, respectivamente.
Segundo o FMI, em 2021, o Brasil deve ter a segunda menor taxa de crescimento entre os emergentes analisados (2,9% do PIB), perdendo apenas para a Nigéria (2,4%).
FONTE:https://epocanegocios.globo.com/